segunda-feira, 7 de maio de 2007

E Mangabeira, enfim, falou...

Para explicar o inexplicável: "Não sou museu, estou vivo; posso rever minhas idéias".

Em entrevista exclusiva à Folha de S. Paulo, Roberto Mangabeira Unger, futuro titular da Secretaria de Ação de Longo Prazo, revela que assumirá o novo posto se desculpando e admitindo ter sido imediatista e agido de acordo com interesses de curto prazo. "Errei no calor do embate".

Em 15 de novembro de 2005, sob o título "Pôr fim ao governo Lula", Mangabeira escreveu na coluna que mantinha na Folha: "O governo Lula é o mais corrupto de nossa história nacional. Desde o primeiro dia de seu mandato, o presidente desrespeitou as instituições republicanas. Imiscuiu-se e deixou que seus mais próximos se imiscuíssem em disputas e negócios privados".

"É a única parte conhecida da minha obra", graceja hoje Mangabeira, auto-intitulado filósofo e professor de direito da Universidade Harvard, com 17 livros publicados. Até meados de 2006, ele manteve o dedo em riste contra Lula, a quem chamou de "avesso ao estudo e ao trabalho".

Mas mudou. "O mesmo presidente que eu havia atacado em termos tão veementes me convida para participar dessa obra de transformação. Eu posso dizer não? Essa é uma concepção moral em política que eu não compartilho", justifica.

FOLHA - Depois de tudo o que escreveu, quem errou ou quem mudou: o sr. ou o presidente Lula?
MANGABEIRA - Errei. Os fatos demonstraram que o presidente não teve envolvimento direto ou indireto naqueles episódios e que insistiu, com a energia exigida pelo cargo, na averiguação necessária. Se até hoje a nação não sabe com exatidão o que aconteceu e quem de fato tem culpa pelos desvios que hajam ocorrido, não é por conta dele.

Nossas instituições políticas falharam duas vezes. Primeiro em manter regras, principalmente de financiamento das campanhas, que deixam os partidos vulneráveis às confusões dos financiamentos e às enroscadas do dinheiro; segundo, em deixar de chegar a uma conclusão segura a respeito do ocorrido. Fica a lição pessoal de que não basta ser ardoroso, como sou. O ardor precisa ser qualificado pela humildade, pela dúvida, pela abertura de espírito.

Ao convidar a mim, que combati com veemência o seu primeiro governo, o presidente demonstrou magnanimidade, que costuma ter duas raízes: força interior e preocupação com o futuro. O mesmo presidente que eu havia atacado em termos tão veementes me convida para participar dessa obra de transformação. Eu posso dizer não? Essa é uma concepção moral em política que eu não compartilho.

FOLHA - O sr. escreveu que o presidente é "avesso ao trabalho e ao estudo". Isso também mudou?
MANGABEIRA - Fui claramente injusto com o presidente. O homem que encontrei em Brasília está possuído por um sentimento de tarefa. Não precisa ser livresco para isso.

FOLHA - O sr. já foi ulyssista, brizolista, cirista e agora lulista. Não falta coerência?
MANGABEIRA - Mas nunca fui estatista nem marxista [risos]. Quero alternativa que assegure a primazia aos interesses do trabalho e da produção, que dê braços e asas à energia frustrada do país, que transforme em flexibilidade preparada o espontaneísmo inculto do nosso povo. Meu erro foi característico do pensador em política. Procurar o outro para fazer o serviço e poder voltar aos seus livros. O outro porém é outro. O meu dever é atuar diretamente.