quinta-feira, 30 de agosto de 2007

As revelações involuntárias do ministro do STF

Veja abaixo alguns trechos da reportagem de Vera Magalhães, manchete da Folha de S. Paulo:

“Em conversa telefônica na noite de anteontem, o ministro Ricardo Lewandowski, do STF, reclamou de suposta interferência da imprensa no resultado do julgamento que decidiu pela abertura de ação penal contra os 40 acusados de envolvimento no mensalão. ‘A imprensa acuou o Supremo’, avaliou Lewandowski para um interlocutor de nome ‘Marcelo’. ‘Todo mundo votou com a faca no pescoço.’ Ainda segundo ele, ‘a tendência era amaciar para o Dirceu’.

Lewandowski foi o único a divergir do relator, Joaquim Barbosa, quanto à imputação do crime de formação de quadrilha para [...] José Dirceu, descrito na denúncia do procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, como o ‘chefe da organização criminosa’ [...].

O telefonema de cerca de dez minutos, inteiramente testemunhado pela Folha, ocorreu por volta das 21h35. Lewandowski jantava, acompanhado, no recém-inaugurado Expand Wine Store by Piantella, na Asa Sul, em Brasília.

Apesar de ocupar uma mesa na parte interna do restaurante, o ministro preferiu falar ao celular caminhando pelo jardim externo, que fica na parte de trás do estabelecimento, onde existem algumas mesas -entre elas a ocupada pela repórter da Folha, a menos de cinco metros de Lewandowski.

A menção à imprensa se deve à divulgação na semana passada, pelo jornal "O Globo", do conteúdo de trocas de mensagens instantâneas pelo computador entre ministros do STF, sobretudo de uma conversa entre o próprio Lewandowski e a colega Cármen Lúcia.

Nos diálogos, os dois partilhavam dúvidas e opiniões a respeito do julgamento, especulavam sobre o voto de colegas e aludiam a um suposto acordo envolvendo a aposentadoria do ex-ministro Sepúlveda Pertence e a nomeação -que veio a se confirmar- de Carlos Alberto Direito para seu lugar. Lewandowski chegou a relacionar o suposto acordo ao resultado do julgamento.

Anteontem, na conversa de cerca de dez minutos com Marcelo, opinou que a decisão da Corte poderia ter sido diferente, não fosse a exposição dos diálogos. ‘Você não tenha dúvida’, repetiu em seguidas ocasiões ao longo da conversa [...].

No geral, o ministro foi o que mais divergiu do voto de Joaquim Barbosa: 12 ocasiões. Além de não acolher a denúncia contra Dirceu por formação de quadrilha, também se opôs ao enquadramento do deputado José Genoino nesse crime, no que foi acompanhado por Eros Grau.

No telefonema com Marcelo, ele deu a entender que poderia ter contrariado o relator em mais questões, não fosse a suposta pressão da mídia. Ao analisar o efeito da divulgação das conversas sobre o tribunal, disse que, para ele, não haveria maiores conseqüências: ‘Para mim não ficou tão mal, todo mundo sabe que eu sou independente’. Ainda assim, logo em seguida deu a entender que, não fosse a divulgação dos diálogos, poderia ter divergido do relator em outros pontos: ‘Não tenha dúvida. Eu estava tinindo nos cascos’ [...].

Já prestes a encerrar a conversa, o ministro, que ainda trajava o terno azul acinzentado e a gravata amarela usados horas antes, no último dia de sessão do mensalão, procurou resignar-se com a exposição inesperada e com o resultado do julgamento. "Paciência", disse, várias vezes. E ainda filosofou: "Acidentes acontecem. Eu poderia estar naquele avião da TAM".

Além dos trechos claramente identificados pela reportagem, a conversa teve outras considerações sobre o julgamento, cuja íntegra não pôde ser depreendida, uma vez que Lewandowski caminhou para um lado e para outro durante o telefonema.

Logo após desligar, ao voltar para o salão principal do restaurante, Lewandowski se deteve para cumprimentar um dos proprietários, o advogado Antonio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, figura muito conhecida em Brasília e amigo de vários advogados e políticos -entre eles o próprio Dirceu, citado na conversa [...]."