segunda-feira, 12 de janeiro de 2015

O desabafo de Marta Suplicy e o fim-de-feira do PT

"Ou o PT muda, ou acaba". A sentença não é de nenhuma figurinha carimbada anti-petista, mas de uma digna e até então leal representante do Partido dos Trabalhadores, a senadora Marta Suplicy, ex-prefeita de São Paulo e candidata outras vezes a prefeita e governadora do Estado, em entrevista imperdível à jornalista Eliane Cantanhêde, no Estadão deste domingo (11/1).

"Cada vez que abro um jornal, fico mais estarrecida com os desmandos do que no dia anterior. É esse o partido que ajudei a criar e fundar? Hoje, é um partido que sinto que não tenho mais nada a ver com suas estruturas. É um partido cada vez mais isolado, que luta pela manutenção no poder. E, se for analisar friamente, é um partido no qual estou há muito tempo alijada e cerceada, impossibilitada de disputar e exercer cargos para os quais estou habilitada", desabafa Marta, absolutamente sincera e direta, como de praxe.

É o PT em decomposição, como avalia outro excelente jornalista, Josias de Sousa:
Não foi ninguém da imprensa golpista nem da oposição retrógrada. Foi Marta Suplicy quem disse cobras e lagartos de Dilma, do governo e do PT. Foi Marta quem desancou companheiros como Aloizio ‘Inimigo’ Mercadante e Rui ‘Traidor’ Falcão. Foi Marta quem declarou ter participado de conversas nas quais o próprio Lula, “extremamente incomodado” com Dilma, a “decepava”. Foi Marta quem sentenciou: “Ou o PT muda ou acaba”. 
Para o PT, só há dois tipos de seres humanos: o petista e o idiota. Vem daí a convicção do petismo de que todas as críticas ao governo e ao partido são suspeitas. Mesmo as opiniões negativas de aparência mais sensata têm essa falha de origem: são de idiotas. De repente, surge um terceiro tipo de ser humano: Marta Suplicy — uma quase ex-petista transitando da militância dogmática, movida à base de fé e revelações divinas, para a idiotia plena, que convive com a dúvida e a crítica.
Espantosa fase essa que o PT atravessa. O absurdo adquiriu para o partido uma doce, uma persuasiva naturalidade. Os petistas se espantam cada vez menos. Se o banquete inclui ensopadinho de dinheiro sujo à moda de Valério, nenhum petista fará a concessão de uma surpresa. Adicionaram-se as propinas do petrolão no cardápio? Pois que seja propina, e com abóbora.
Ao desenhar um quadro devastador da legenda, Marta Suplicy apenas reintroduz nos seus hábitos o ponto de exclamação. Faz isso com um atraso hediondo. Marta demorou tanto para acordar que acabou perdendo o essencial. “Ou o PT muda ou acaba”, disse ela. Ora, o PT já acabou faz tempo. Só Marta não notou que isso que está aí na praça é um ex-PT bem mequetrefe. Aquele partido casto e imaculado da década de 80 morreu. Saiu da vida para cair na esbórnia.
Perfeito o obituário traçado por Josias de Sousa a partir do diagnóstico de Marta Suplicy. Ela sabe que não vai ser fácil enfrentar a ira dos petistas atingidos por suas declarações. Mas quem tem medo da verdade? Marta já mostrou que não tem. Entre os defeitos da ex-prefeita certamente não estão a covardia e a fuga de suas convicções. Ao contrário. Muitas vezes ela peca por ser turrona e suscetível ao sincericídio.

O rumo anunciado por Marta - a porta de saída do PT - não é novidade para quem acompanha a política e tem estômago sensível para a podridão do poder a qualquer custo. Segue os passos de outras mulheres honradas como Luiza ErundinaMarina SilvaHeloísa HelenaSoninha Francine.

Nas redes sociais, os ataques já começaram. Aliás, a agressão se dá contra tudo e contra todos que, na visão estreita do petismo, representam qualquer possibilidade de obstáculo político ou ameaça eleitoral.

Além das mulheres mencionadas acima, que deixaram a legenda, a própria jornalista Eliane Cantanhêde é vítima frequente do ódio da milícia PTbull. Seu crime? Exercer a profissão sem aceitar ser cooPTada pelos atuais inquilinos do poder.

Uma conclusão óbvia: a ruindade do PT é tão grande, mas tão grande, que a oposição mais consistente se origina dentro do próprio partido (repare que não foi à toa que os principais concorrentes de Dilma na eleição de 2014, além do tucano Aécio Neves, eram todos ex-petistas: Marina SilvaEduardo JorgeLuciana Genro, entre outros candidatos de partidos menores).

O que pensamos disso tudo? Parabéns, Eliane, pela ótima entrevista. Parabéns, Marta, pela coragem de dizer as verdades, doa a quem doer. E vamos, sim, dialogar sobre o futuro de São Paulo e do Brasil. Não são poucos os que se sentem frustrados e traídos ao ver no que se transformou o antigo Partido dos Trabalhadores. Precisamos dar um basta a esse modus operandi criminoso do PT na política.

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