Que a mídia se paute no frisson entre as torcidas pró-Alckmin e pró-Kassab, é natural e compreensível. Daí a ter os próprios candidatos e seus simpatizantes se engalfinhando como se fossem inimigos figadais, passa a ser quase uma atitude suicida. É legítimo e democrático haver candidaturas próprias à Prefeitura de São Paulo do PSDB e do DEM - assim como do PPS, o triunvirato partidário que elegeu José Serra prefeito em 2004.
A lógica de uma eleição em dois turnos desobriga o atrelamento automático. Forçar uma união agora, tentando desqualificar qualquer um dos atuais postulantes deste campo que resgatou a gestão da cidade depois do desgoverno instalado pelo PT, é que seria insano, incoerente e ilegítimo. Eventualmente até podemos ser adversários eleitorais, já que não há um nome de consenso - como foi Serra na última eleição paulistana - para unir PSDB, DEM e PPS no primeiro turno. Mas não somos inimigos enquanto nos unir a defesa das instituições democráticas e uma visão essencialmente republicana. O nosso antagonismo é ao aparelhamento do estado, à compra de votos, a esse neoliberalismo extemporâneo, a mensaleiros, sanguessugas e suas variações igualmente repugnantes.
O PPS apresenta a pré-candidatura da vereadora Soninha Francine à Prefeitura de São Paulo como alternativa para qualificar o debate, resgatar princípios e ideais que parecem fora de moda na política, construir um programa de governo verdadeiramente identificado com os cidadãos paulistanos e reaproximar o partido de movimentos populares e sociais.
É assim que entendemos que devem se colocar as diversas candidaturas no primeiro turno das eleições. Mais importante do que tentar antecipar a polarização natural do segundo turno é a construção de uma proposta viável para a cidade e a apresentação à sociedade de um programa detalhado para dar continuidade às conquistas da atual gestão, iniciada por José Serra e mantida por Gilberto Kassab. E reconhecendo as boas práticas de outras gestões, experiências positivas de outras metrópoles, sem deixar que a rivalidade partidária se sobreponha ao bom senso e ao verdadeiro interesse público.
Pois é desta forma que se coloca a candidatura de Soninha: vamos disputar a prefeitura discutindo grandes temas, pensando a cidade no curto, médio e longo prazo. Analisar honestamente as possibilidades de solução de seus problemas, sem nenhum constrangimento ou obrigação de falar bem disso ou daquilo e mal deste ou daquele. E sem ter uma candidata que promete ser a sabe-tudo, resolver tudo, ter todas as boas idéias do mundo, mas assumindo o compromisso de discutir abertamente o que for mais complexo, mais polêmico, tanto com especialistas quanto com aqueles diretamente envolvidos em cada questão -- o arquiteto e o morador do conjunto habitacional; o gestor de saúde e o usuário; o técnico em transporte e o passageiro do ônibus.
Precisamos criar ou fazer funcionar muitos instrumentos de participação e controle, descentralizar a gestão, respeitar as peculiaridades dessa cidade imensa. O nosso objetivo é a qualidade de vida do cidadão paulistano, e temos certeza que a administração deve estar acima de disputas partidárias. O que não exclui uma visão política da administração, mas a política é meio e não fim.
Por outro lado, parece fundamental aos partidos, em uma eleição de dois turnos, reiterar à sociedade as suas identidades e marcas próprias. As eleições municipais podem favorecer este reposicionamento estratégico das legendas. Uma candidatura como a de Soninha Francine, pelo PPS, pode dar maior visibilidade e conteúdo a este arcabouço de intenções.
Se não bastasse tudo isso, São Paulo é o principal pólo do embate político, sócio-econômico e ideológico que será travado nacionalmente nas eleições de 2010. As várias candidaturas que se colocam no primeiro turno em 2008 e o rearranjo de forças - como o possível resgate do PMDB para este campo e o deslocamento do "bloquinho" (PDT, PSB e PCdoB) para fora da órbita petista - são emblemáticos para reproduzir no segundo turno paulistano a aliança que há quatro anos derrotou na cidade um modelo absolutamente equivocado de "governabilidade" (base de lançamento dos mesmos métodos deploráveis e práticas fisiológicas que foram reproduzidas no governo federal e geraram sucessivos escândalos). Uma coisa é óbvia: devemos ser mais inteligíveis ao eleitorado. Mas não subestimemos o eleitor. Cada paulistano está apto a fazer a sua opção pelo melhor.
Carlos Eduardo Fernandes, presidente municipal do PPS/SP