segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Um artigo sobre o Plano Diretor de São Paulo

(Artigo de Luiz Carlos Costa, publicado na Folha de S. Paulo)


São Paulo diante de um plano problemático

Fica difícil reconhecer no projeto de Plano Diretor o amadurecimento necessário para se conduzir São Paulo ao futuro desejado

Dá o que pensar a atitude da Prefeitura de São Paulo de evitar um debate franco e objetivo do projeto de Plano Diretor cuja minuta divulgou recentemente.

Essa atitude evasiva se concretizou ao ser apresentado no final de agosto um projeto de lei excepcionalmente complexo e volumoso (são 256 artigos, alguns longos) sem que se oferecesse à sociedade condições para se inteirar do mesmo e elaborar suas críticas e contrapropostas.

A administração municipal parece ter esquecido que o plano, estratégico e de longo prazo, não é seu, mas da sociedade. E que as determinações constitucionais expressas no Estatuto da Cidade exigem plena participação popular em todas as partes e etapas de sua elaboração.

Na verdade, ficou impossível ao cidadão perceber, por exemplo, o quanto o projeto oficial reforça a excessiva liberdade concedida ao setor imobiliário para multiplicar empreendimentos que invadem os bairros constituídos, sem atenção aos efeitos danosos que provocam.

São problemas conhecidos, como os congestionamentos paralisantes, a deterioração ambiental associada à saturação de áreas construídas, a expulsão de moradores de renda baixa ou a desestruturação de bairros passíveis de recuperação.

Ao contrário, o plano autoriza que, em áreas extensas, empreendimentos elitizantes se multipliquem, desde que paguem pelo direito de construir mais. Recursos que nunca são suficientes para permitir ao poder público atender às demandas decorrentes do uso excessivo do solo.

Por outro lado, o plano não prevê que, além das zonas especiais instituídas, seja garantida às comunidades a oportunidade de formular normas públicas válidas para zonas comuns, conforme diretrizes do próprio Plano Diretor, pelas quais se preserve a qualidade urbanística e ambiental e se conciliem interesses locais divergentes.

Sejam os interesses do setor imobiliário de atender o mercado, sejam os do setor público de produzir infraestrutura e serviços, sejam os de associações de moradores que lutam por qualidade habitacional.

Outro problema é que a proposta para a reestruturação geral do território urbano demonstra-se débil e incompleta. Ela é centrada na constituição de faixas adensadas e com padrões construtivos próprios que ladeariam os corredores de ônibus (em boa hora propostos), mas que, ao se sobreporem automaticamente a quadras e bairros existentes, criariam problemas imprevisíveis.

O fato é que o plano não chega a propor um projeto de reestruturação territorial capaz de reorientar a produção da cidade do futuro. Projeto que teria de definir um sistema de transportes de grande capacidade, capaz de atender as demandas atuais e futuras e criar a base de cálculo dos potenciais construtivos dos diferentes segmentos do território. Esse sistema só poderá ser viabilizado com um esforço inédito dos poderes públicos atuantes na setor, notadamente os responsáveis pelo transporte de massa como trens e metrô.

Além disso, a estrutura territorial a propor teria de dar suporte ao desenvolvimento de todas as partes da cidade, integrando os vários polos de atividade econômica e social, desenvolvendo o novo centro metropolitano expandido e promovendo a formação de macrorregiões que ganhem autonomia para melhorar a governança dessa imensa cidade.

Quanto ao centro metropolitano, o plano não apresentou uma síntese dos estudos em desenvolvimento sobre o Arco do Futuro, o Arco do Tietê e a Operação Água Branca.

Fica difícil reconhecer no Plano Diretor o amadurecimento necessário para se conduzir com segurança São Paulo ao futuro desejado.

Resta a esperança de que se institua um novo período de discussão, no qual o Executivo se digne a examinar críticas. É a única forma de se evitar a adoção intempestiva de processos que comprometam irreversivelmente o futuro da metrópole.

www.luizcarloscosta1935.wordpress.com