Merval Pereira, O Globo
A eleição para a Prefeitura de São Paulo, conforme está se desenhando até o momento, mais parece a perfeita tradução da mediocridade da política brasileira. Todos os candidatos até aqui apresentados são “japoneses”, diz-se na gíria política, isto é, são todos igualmente desconhecidos do eleitorado, e semelhantes nos seus anonimatos.
Diante desse quadro, não restou ao PSDB alternativa que não fosse a prévia, uma maneira de a direção partidária lavar as mãos na escolha de seu candidato, deixando que a militância decida o destino do partido que, pela primeira vez em muitos anos, ela, direção, não conseguiu definir.
Ao mesmo tempo, as prévias podem impulsionar uma revitalização da militância tucana na capital paulista, o que daria novo fôlego ao partido.
Os tucanos estão à frente do governo do estado de São Paulo há nada menos que 16 anos, e retomaram o controle da Prefeitura em 2004, quando José Serra, derrotado em 2002 para a presidência da República por Lula, venceu a petista Marta Suplicy, tendo como vice Gilberto Kassab, àquela altura no DEM, que assumiria o posto para Serra disputar (e vencer) o governo do Estado em 2006.
O único nome forte para o PSDB tentar manter a hegemonia política na prefeitura seria o do próprio Serra, que até o momento mostra-se firme na disposição de não concorrer, guardando-se para uma hoje improvável candidatura presidencial em 2014 pelo PSDB.
Mas ainda há setores do partido que alimentam a esperança de que Serra venha a se candidatar no último momento, que seria entre março e abril.
O adiamento das prévias para março foi feito de comum acordo entre o governador Geraldo Alckmin e Serra. O governador espera dar tempo para Serra se decidir. Serra diz que ganhou tempo para tentar um acordo entre os partidos aliados.
Na sua visão, o ideal seria que cada um dos partidos potencialmente aliados – PSDB, PSD, DEM e PPS – deveria indicar seu candidato, e as pesquisas e negociações decidiriam a chapa mais forte.
Há, no entanto, quem acredite, inclusive no PT, que Serra deixou a decisão para março para ganhar mais tempo. Desta vez, a famosa indecisão de Serra tem sua razão de ser: se anunciar que disputará a Prefeitura, estará ao mesmo tempo anunciando que abandonou de vez seu sonho de vir a presidir o Brasil.
Isso por que, para dissipar qualquer dúvida de que ficará na Prefeitura até o final do mandato se eleito, uma de suas principais fontes de rejeição hoje, teria que também anunciar seu apoio à candidatura de Aécio Neves à Presidência pelo PSDB em 2014.
Mesmo que sua candidatura à Presidência continue inviável no PSDB, Serra sempre teria a opção de tentar seu sonho presidencial por outra legenda, o PSD de Kassab ou o PPS, numa manobra radical.
O fato é que para disputar a Prefeitura paulistana de forma competitiva será necessário ter um discurso coerente, o que fica difícil para o PSDB em relação à gestão de Kassab se os dois partidos forem para a disputa desunidos.
Este foi o problema do Alckmin em 2008: não podia atacar a prefeitura, pois Kassab completara, de modo absolutamente fiel, o mandato de Serra na cidade, e também não podia defendê-la.
Neste ano, separados, nem o PSDB nem o PSD terão discurso na campanha, e o mais provável é que, sem a aliança, Kassab opte por não lançar candidato próprio, para não virar o grande saco de pancada da campanha, além do mais com pouco tempo de TV.
Para uma aliança, o PSD tem um candidato mais forte politicamente que os pré-candidatos do PSDB: o vice-governador Afif Domingos, que entra bem na classe média paulistana e tem a rede das Associações Comerciais como suporte a um discurso de defesa do consumidor, que marca sua vida política, levando-o a quase se eleger para o Senado. A outra opção de Kassab, o ex-presidente do Banco Central Henrique Meirelles, peca pela falta de apoio político.
Se a aliança do PSD de Kassab com o PSDB se mostrar inviável – e tudo indica que o será, pela distância que separa Alckmin do prefeito -, o mais provável é que o PSD se aproxime do PT, o que poderia dar vitória ao candidato de Lula, o hoje ministro da Educação Fernando Haddad, até mesmo no primeiro turno, pois traria para ele parte da classe média paulistana.
Mesmo com a impopularidade do prefeito em baixa neste momento, ele tem ainda recursos para reverter essa imagem. Além do mais, será difícil para o PSDB atacar sua gestão, pois ele tem se mantido fiel às diretrizes da gestão de Serra, e um ataque à sua gestão pode reverter contra o próprio PSDB.
O governador Geraldo Alckmin tem na reeleição seu objetivo principal, e considera que a eleição para a Prefeitura não é determinante para o resultado da eleição de governo do Estado.
Em conversas com aliados, ele tem lembrado que perdeu a prefeitura em 2000, mas ganhou o Estado em 2002.
Num quadro mais amplo, Jânio ganhou de Fernando Henrique em 1985, e o PMDB ganhou o Estado em 1986 com Quércia; Erundina ganhou em 1988 pelo PT, mas o Quércia fez o sucessor em 1990. Maluf ganhou em 1992, mas Covas venceu em 1994. Serra perdeu em 1996, mas Covas se reelegeu em 1998.
Desta vez, no entanto, com a disposição de Lula de desbancar o PSDB do controle político de São Paulo, o quadro é diferente: o PT está entrando no décimo ano no governo central, com uma máquina política funcionando a pleno vapor e Lula no auge de seu prestígio político, mesmo que sua capacidade de influir na eleição de São Paulo seja reduzida, como mostraram as derrotas de Marta Suplicy e de Mercadante.
Se obtiverem o apoio da Prefeitura, com Gilberto Kassab à frente do PSD, terão também uma máquina local para alavancar a candidatura de Haddad, e o prefeito se livrará da principal fonte de críticas a seu governo.
Os demais candidatos, tanto Gabriel Chalita pelo PMDB quanto eventualmente Celso Russomano pelo PRB e Soninha pelo PPS não têm cacife político para transformar as críticas à Prefeitura paulistana em elemento catalisador da campanha.
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