Campanha na Web cria dilemas para juizes e tribunais
Carlos Castilho,
Observatório da Imprensa
Quase 39 milhões de brasileiros, mais ou menos a quarta parte dos eleitores, devem usar a Web como uma das principais fontes de informação nas eleições de novembro. Será a primeira vez que a campanha eleitoral via internet chegará a um número tão grande de brasileiros.
Só isto já dá à votação municipal deste ano uma importância especial porque permitirá pela primeira vez descobrir um pouco do que se esconde nos meandros da internet tupiniquim, um território ainda amplamente desconhecido e que, potencialmente, pode de oferecer algumas surpresas, como mostra o fenômeno Barack Obama, nos Estados Unidos.
O eleitorado com acesso à internet vem crescendo a cada eleição, a um ritmo médio de quase 50% e colocando os tribunais eleitorais do país numa situação complicada. Como a Web ainda é uma grande incógnita para os magistrados, eles preferem adiar definições sobre propaganda eleitoral em ambiente virtual, como aconteceu com o Tribunal Superior Eleitoral, há pouco mais de uma semana, numa consulta feita pelo deputado federal José Fernando de Oliveira (PV-MG).
A justiça eleitoral é normativa, ou seja, fixa regras, mas a Web é um território onde a lógica das leis convencionais é de difícil aplicação, porque é quase impossível congelar situações dada a constante inovação e fluidez dos mecanismos e processos na rede mundial de computadores.
Apesar do crescimento vertiginoso da internet brasileira, a justiça eleitoral manteve as mesmas regras vigentes nos pleitos anteriores — o que abre a porta para questionamentos os mais diversos. O principal deles tem a ver com a veiculação de informações falsas na campanha eleitoral pela internet.
Se a justiça eleitoral brasileira for tão lenta quanto a nossa justiça comum, os processos sobre delitos eleitorais vão se espichar por vários anos, como mostrou o recente julgamento sobre a proibição do polêmico filme da modelo Daniela Cicarelli com seu namorado, que circula na Web desde 2006.
A internet é um espaço que desafia a justiça no mundo inteiro porque a rede criou processos e sistemas que não se encaixam nas normas jurídicas convencionais. A maior parte dos esforços de submetê-la às leis vigentes não funcionou. Por outro lado, a grande maioria dos magistrados prefere empurrar o problema com a barriga diante da complexidade da questão.
Na campanha eleitoral para as eleições presidenciais de novembro nos Estados Unidos, por exemplo, os candidatos estão criando suas próprias regras. O candidato democrata Barack Obama, apontado como o primeiro político norte-americano feito pela internet, criou um complexo sistema para lidar com informações falsas.
Obama montou o site Fight the Smears (Combata as Calúnias) operado por uma equipe de voluntários espalhada por todos os Estados Unidos, para desmontar rumores e boatos antes que eles provoquem danos irreparáveis à imagem do primeiro candidato negro à presidência do país. A decisão foi acelerada pelos boatos em torno do pastor da família de Obama, e dos rumores sobre a existência de um vídeo em que a mulher do candidato estaria insultando norte-americanos brancos.
A iniciativa sinaliza uma inevitável batalha informativa pela Web, na qual cada candidato buscará uma blindagem noticiosa na mídia norte-americana. Indica também uma possível nova estratégia a ser explorada por políticos interessados em usar a Web para conquistar corações e mentes.
No Brasil, os dados da eleição de 2006 mostram que 6% dos eleitores usam a Web como ferramenta eleitoral, superando as revistas semanais e perdendo para a TV (76%), jornais (29%) e rádios (28%). Nas classes A e B, a Web só perde para a TV e os jornais.