Ontem a Folha promoveu um debate na sua página A3 sobre violência e 
direitos humanos. O pano de fundo: um adolescente negro acusado de praticar 
furtos em série no Rio acabou agredido e preso nu, pelo pescoço, a um poste.
A apresentadora de TV Raquel Sheherazade escreveu a favor do direito de 
cidadãos se defenderem e de prenderem quem os ameaça. O deputado federal Ivan 
Valente, do PSOL paulista, rebateu dizendo que "ressuscitou-se o Pelourinho 125 
anos após o fim da escravidão". 
Gostei de ler os dois artigos com opiniões bem antagônicas. Mas ficou para 
mim uma dúvida: onde está o centro? Afinal, o Brasil não é só a busca do direito 
de prender pessoas com as próprias mãos. Tampouco é um país no qual a escravidão 
seja cotidiana, apesar do lamentável e bárbaro episódio do Rio. 
Tem havido uma polarização exacerbada nos grandes debates brasileiros. É 
sempre fácil enxergar as posições nos dois extremos do espectro 
político-ideológico. Só o centro parece invisível. Até porque uma análise 
moderada será logo classificada "de direita" pelos mais liberais. Ou de 
"condescendente com a esquerda" por quem luta na trincheira do conservadorismo. 
A grande vantagem --alguns dirão desvantagem-- da história de conchavos 
sociais do Brasil foi ter colocado de pé uma nação quase sem conflitos 
sangrentos generalizados. A disposição para encontrar saídas pactuadas deu-se em 
vários momentos, como no fim da ditadura militar. Na cultura brasileira, o 
extremismo de direita ou de esquerda nunca teve tanto espaço como em países 
vizinhos na América Latina. 
Nesta semana, a morte do cinegrafista Santiago Andrade também produziu grande 
polarização. Sem contar a tentativa de alguns querendo se apropriar da tragédia 
alheia. Há hoje muitas ideias fora do lugar no Brasil. É um enigma aonde isso 
vai dar, sobretudo em ano eleitoral. 
(Artigo do jornalista Fernando Rodrigues publicado nesta quarta na Folha de S. Paulo)
