Esta é uma contribuição ao debate aberto pelo presidente do PPS, deputado Roberto Freire (SP), a partir documento "Unir a esquerda democrática para mudar o país". Trata da trajetória recente do PPS, seu posicionamento em relação ao governo do PT, o futuro do partido e as teses que precisa desenvolver para se reposicionar de forma independente na vida nacional.
Alberto Aggio
Caetano Pereira de Araujo
Juarez Amorim
Três momentos da trajetória eleitoral do PPS com suas decisões e consequências devem ser particularmente avaliados pelo Congresso.
Em primeiro lugar, a candidatura que não houve. Em 1994 o PPS apoiou Lula no primeiro turno. À luz das nossas decisões posteriores, nada justifica essa posição.
Mais grave, também à luz de nossas decisões anteriores, nada justificava essa posição. Em todas as grandes questões nacionais, como colégio eleitoral, constituinte, parlamentarismo e plano real, o PT posicionou-se de um lado e o PPS do outro.
A decisão de aliança com o PT e seus aliados, todos ainda na perspectiva de uma frente popular, só pode ser compreendida hoje pela fragilidade política do partido recém criado. Essa fragilidade fez prevalecer o apego às velhas fórmulas, o apelo a uma identidade de esquerda genérica que existia só nas palavras e no passado, não na política real.
A proposta correta seria: candidatura própria, demarcação da identidade política do PPS e participação no governo FHC com autonomia crítica.
A adesão à candidatura Lula representou a renúncia do PPS de assumir publicamente a defesa de uma cultura política democrática, baseada nos valores e princípios da Constituição de 1988, a mais democrática de nossa história.
Em segundo lugar, a simbiose com Ciro Gomes. Fora do governo, a sobrevivência eleitoral do partido e a realização de seus objetivos dependiam da uma expectativa futura de governo. Daí o convite à filiação de Ciro Gomes, na perspectiva da candidatura à Presidência da República.
A relação com Ciro Gomes demanda um balanço. Muitos mandatários filiaram-se ao partido, muitos saíram com ele. Nosso problema principal não foi filiar Ciro Gomes e apresentar sua candidatura por duas vezes, mas não afirmar com clareza a posição do partido. De certa forma capitulamos em 1998 e 2002, como na eleição de 1994, ao permitir a substituição ou relativização da estratégia da reforma democrática do estado, em benefício da idéia da centralidade da questão da dívida pública, idéia que a realidade demonstrou equivocada. Data daí um deslocamento da posição do partido na direção de um viés economicista.
Em terceiro lugar o posicionamento eleitoral do partido em 2006 e 2010. Não se trata de questionar a decisão do apoio a Alckmin e a Serra. Nosso problema foi apoiar esses candidatos sem conseguir marcar a diferença específica que o PPS representava na sua campanha. Aderimos a essas candidaturas sem marcar nossa presença como pólo avançado da coalizão. Não os pressionamos para uma postura de verdadeira mudança. E, para ter mais do mesmo, o eleitorado preferiu os candidatos do governo.
As razões da nossa oposição ao governo do PT
É preciso também examinar a posição crítica do PPS ao governo ao governo Lula e ao governo Dilma. Nossa crítica tem sido ambivalente. Por vezes criticamos o governo de uma perspectiva de esquerda moderna e democrática, por vezes a partir do ponto de vista da velha social-democracia.
Nossa crítica deve ser contundente, porém reveladora de nossas posições. Para tanto, deve ter como centro a política, não a política econômica; deve ter um foco programático, não um foco eleitoral, e, para ser eficaz, não nos pode deixar indiferentes às ambiguidades, contradições e mudanças no campo do governo.
Uma crítica desse tipo não pode partir da negação dos avanços havidos nos últimos anos, avanços percebidos como tais pela maioria da população que deu três vitórias eleitorais seguidas à coalizão eleitoral liderada pelo PT. Deve demonstrar que:
a) – esses avanços têm origem em políticas de governo anteriores, sempre combatidas pelo PT;
b) – seus resultados foram potencializados por uma conjuntura internacional favorável;
c) – mesmo a continuidade dessas políticas por parte do governo petista está em contradição com seu discurso eleitoral;
d) – a adesão pragmática e não refletida a políticas do governo anterior, revelada pela contradição entre discurso e prática, não qualifica o governo petista a dar continuidade a essas políticas; e
e)– os problemas que se acumulam não encontrarão solução nas propostas da retórica governista.
Um novo partido
O primeiro desafio do Congresso do PPS é pensar um novo partido num mundo que, ao contrário de vinte anos atrás, presencia o enfraquecimento dos partidos de massa.
Partidos perdem filiados rapidamente no mundo inteiro. Paralelamente, dependem cada vez menos de contribuições pessoais, de militantes, filiados e simpatizantes e cada vez mais de recursos públicos.
Nesse mundo, em que eleitores podem dispensar a intermediação dos partidos para fazer política, a organização partidária deve ser mais flexível. A relação direta com os movimentos sociais, por meio da filiação de suas lideranças, permanece relevante. No entanto, partidos precisam aprimorar sua capacidade de direção por meio da capacidade de diálogo, formulação, coleta das demandas e construção de confiança junto a esses movimentos. O novo partido que emerge é, principalmente, um partido da interlocução, um partido ponte que liga os movimentos sociais, as vozes das ruas e a institucionalidade democrática.
O segundo desafio é avaliar a efetivação de duas das propostas fundantes do PPS: um partido de novo tipo e uma nova formação política.
A nova formação política foi uma proposta que não se realizou. Na prática foi assumida, por alguns setores do partido como pretexto para subestimar o trabalho de fortalecimento partidário.
O verdadeiro significado da proposta, o reconhecimento de que as tarefas de mudança exigem a agregação de um conjunto diversificado de forças permanece atual. No entanto, sua efetivação tem como premissa um partido forte, com identidade política bem definida e clareza em relação a seus objetivos e caminhos. Só quando houver um PPS com maior expressão política e eleitoral a proposta de nova formação política deve retornar à agenda de discussão do partido.
O partido de um novo tipo, nos moldes propostos nas Resoluções políticas que se seguiram a fundação permanece também um objetivo não realizado. A regra eleitoral pressiona continuamente o partido na direção de uma forma organização compatível com o personalismo que vigora na política nacional. Só a discussão política continuada teria a capacidade de contrapor-se a essa tendência.
Para manter a discussão política acesa é necessário, contudo, fortalecer a institucionalidade partidária, com base nos princípios da direção coletiva, da transparência e difusão das informações e da renovação permanente dos organismos de direção.
Para tanto é necessário superar a situação de atrofia em que se encontram os coletivos dirigentes do partido. Na maioria dos estados e municípios, as direções encontram grande dificuldade para reunir-se e a condução do partido fica restrita ao trabalho de poucos dirigentes, principalmente dos presidentes.
No plano nacional vemos reproduzir-se essa situação. O Diretório Nacional pouco se reúne e quando o faz não aprova diretrizes políticas e propostas de trabalho para o conjunto do partido. A Comissão Executiva se reúne com uma freq?ência muito inferior ao necessário e seus encontros não tem tido, com algumas exceções, como pauta as decisões relevantes a serem tomadas.
Na prática, as decisões cotidianas do partido têm partido do Secretariado, órgão que, em tese apenas operacional, tem tomado o lugar da Comissão Executiva na direção partidária.
Para superar essa situação são necessários organismos dirigentes menores, com maior agilidade operacional e reuniões organizadas com pautas alimentadas pelos informes e balanços das direções.
A renovação das direções partidárias, por sua vez, deve ser exigida em cada momento congressual, por meio da inclusão no estatuto da regra da não recondução de dirigentes nos mesmos cargos ocupados no período anterior.
Roteiro e Temas para o Documento de Abertura de Discussão do XVII Congresso do PCB-PPS
1 – Do PCB ao PPS: uma avaliação crítica.
2 – PPS: 20 anos de percurso
3 – As nossas razões para estarmos na oposição
4 – A democracia como núcleo e léxico da política moderna.
5 – Ultrapassando o revolucionarismo e os limites da socialdemocracia.
6 – O socialismo numa nova perspectiva.
7 – Transformações econômicas em tempo de globalização: os desafios do novo mundo do trabalho.
8 – Uma nova economia, desafios da produção numa visão ecológica sustentável.
9 – A nova sociedade brasileira e os limites da “revolução democrática brasileira” via consumo.
10 – Uma atualização do Brasil: novas visões da questão agrária e da questão urbana.
11 – Um novo programa energético para o Brasil avançar para o futuro.
12 – O Brasil na cultura-mundo.
13 – Uma orientação democrática às questões da mulher e aos novos direitos subjetivos.
14 – Por um novo desenvolvimento regional e local: empreendedorismo e novos arranjos produtivos.
15 – Por uma nova educação, rumo a uma “sociedade educante”.
16 - Por uma juventude ativa e voltada para a construção de uma sociedade solidária e democrática
17 – Novos rumos para a ciência e tecnologia no Brasil.
18 – O desafio da infra-estrutura para se avançar rumo a um novo padrão de desenvolvimento.
19 – Por uma regulação do capital financeiro no Brasil e no mundo.
20 – Por uma reforma democrática do estado.
21 – Um novo partido, uma nova institucionalidade.
22 – Do PPS à nova formação política da democracia e do socialismo: abertura e convocação para a construção de uma esquerda moderna para o Brasil.
23 – Uma nova força política, democrática, reformista e independente.