Hoje, depois de 24 anos de militância exercida também no PSDB, desfilio-me do meu último reduto partidário, o PV; atuarei suprapartidariamente
Cheguei ao Congresso Nacional em 1987, como deputado constituinte pelo PMDB, aos 31 anos.
Hoje, após 24 anos de militância exercida também no PSDB, desfilio-me do meu último reduto partidário, o Partido Verde, que imaginei pudesse vir a ser o endereço da inovação e da coragem de mudar a política brasileira para alinhá-la com o futuro, com a luta por um desenvolvimento justo e sustentável.
Não posso deixar de reconhecer no presente a energia social e política vivida durante a elaboração da Constituição de 88, quando o país reencontrou-se com a democracia por meio de um novo pacto político.
Foi um marco insuperável, porque dava enorme esperança -talvez um tanto irrealista- de que a política, a partir dali, disporia de seus recém-conquistados instrumentos para ser o lócus da construção de um país aberto ao clamor por valorização da diversidade, combate aos preconceitos e desigualdades, participação social no processo de tomada de decisões e concretização de propostas econômicas, políticas e sociais que então emergiam do novo conhecimento sobre as consequências da degradação ambiental no planeta.
A sociedade brasileira compreendeu progressivamente a transição histórica que já se anunciava naquela época. Mas o sistema político, não. Demos passos importantes: estabilidade econômica e política, liberdade de manifestação, ampliação dos direitos sociais e reconhecimento de novos direitos, entre os quais o de um meio ambiente sadio para as presentes e as futuras gerações.
Estive na linha de frente da elaboração de parte da legislação brasileira: artigo 225 da Constituição Federal, Lei da Mata Atlântica, Política Nacional de Educação Ambiental, Política Nacional de Recursos Hídricos, Lei de Acesso à Informação, Lei de Defesa da Concorrência, Política Nacional de Resíduos Sólidos. Participei de um período em que a política partidária estava associada a conteúdo e a causas tangíveis nas suas propostas.
Mesmo sem mandato legislativo, continuei a atuar em instâncias públicas importantes, como o Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas, a Rio+10, o Fórum Paulista de Mudanças Climáticas Globais e de Biodiversidade, e na elaboração de diversas legislações, como a Política Estadual de Mudanças Climáticas.
Ao mesmo tempo, assisti ao gradual descolamento do sistema partidário da sociedade, transformando-se em espaço prioritário de conquista e manutenção de poder, de administração de butins eleitorais, ao largo das demandas, dos sonhos e da criatividade que vêm da sociedade. Ou seja, os partidos estão parados, fechados e deslocados dos temas que hoje entendo como os mais importantes para a sociedade.
Sempre procurei ser uma ponte para a intervenção da sociedade civil com os governos e Parlamentos, por acreditar que qualquer coisa que se faça à revelia dela não é consistente nem legítima. É por onde pretendo prosseguir.
Colaborar para desobstruir o caminho de uma agenda para o século 21, que liberte o país das visões ultrapassadas pelos fatos e pelas novas configurações sociais. Não desisti da política.
Quero atuar suprapartidariamente com os novos movimentos, que buscam cidadania planetária e discussão mais profunda sobre as alternativas do Brasil e do planeta.
Continuo na estrada, mas desço definitivamente do ônibus do sistema partidário. Que, aliás, está parado à beira do caminho, quebrado, vazando óleo, com os pneus carecas, poluindo o ar. E seus dirigentes não percebem que, cada vez mais, os passageiros descem e se juntam numa caminhada, à sua revelia.
FABIO FELDMANN, 56, é ambientalista. Foi deputado federal por três mandatos e candidato a governador do Estado de São Paulo pelo PV. (Artigo publicado na Folha de S. Paulo desta terça-feira, 28 de junho de 2011)