De março a julho de 2007, o Partido Popular Socialista, com a participação aberta à toda sociedade, promoverá uma Conferência Nacional para discutir o que é ser uma esquerda moderna, suas características e seu projeto transformador para o Brasil.
Esta iniciativa se fundamenta na necessidade de abrir um amplo e profundo debate com vários setores da sociedade brasileira, face a constatação de que os grandes partidos da esquerda, desde a redemocratização, chegaram no governo central do país e não se revelaram no seu compromisso de tentar mudar o país, enfrentando suas desigualdades sociais e regionais.
Veja a seguir o conteúdo da Resolução Política a respeito da Conferência:
EM TORNO DE UM PROJETO PARA O BRASIL
A política como arte e vértice para se encaminhar e resolver os problemas da sociedade está, lamentavelmente, sob suspeita no Brasil. E seus atores, os partidos de modo geral, uns mais que outros, e os políticos que trilham o caminho do mandato eletivo são vistos com desconfiança e até desprezo por ampla e crescente parcela dos brasileiros.
Essa crítica generalizada, feita de forma explícita ou subterrânea, ainda não vem se materializando nas urnas, pois os instrumentos de controle da opinião pública, a leniência de certos setores da sociedade com os desmandos, as estruturas de poder que descem e viciam os segmentos mais populares e alimentam esperanças infundadas nas camadas mais esclarecidas, ainda vêm tendo fôlego para manter em pé as arcaicas estruturas políticas nacionais e suas representações. E elas fazem a política caminhar para um lugar inseguro quando estão em jogo a democracia e a República.
Some-se a esse fenômeno um drama maior, vivido em todo o mundo, qual seja, a desmontagem de paradigmas que nortearam utopias e concepções transformadoras ao longo de quase um século sem a sua substituição por modelos que pudessem reorientar a política positivamente e resguardar padrões éticos consagrados pela luta dos povos a favor de dias melhores e mais felizes para todos.
Acontece que, nas várias regiões do planeta, grande parte das organizações de esquerda fizeram o seu aggiornamento, buscando compreender as novas realidades mundial e local, e identificar novas formas de enfrentar a complexa transição entre a sociedade industrial e a emergente sociedade do conhecimento, fruto sobretudo de uma célere revolução científico-tecnológica. Só que entre nós, poucos têm sido os partidos e lideranças atentos à contemporaneidade, ao não enxergarem a crise dos instrumentos de representação típicos da sociedade historicamente esgotada - associações, sindicatos, partidos políticos.
Dilemas Postos
Dois dilemas, portanto, emergem com força nos dias atuais para aqueles que ainda acreditam no primado da política referenciada pela participação popular: afirmar uma esquerda moderna e democrática, e uma agenda de profundas reformas capaz de dar rumo ao país, de forma a superar e deixar para trás práticas e comportamentos que corrompem, que desmobilizam a consciência crítica, que assaltam os recursos do Estado e, assim, colocam o processo democrático em risco.
É que temos consciência de que esse grande projeto nacional, não pode nem deve ser tarefa de um único partido político, nem tampouco de uma classe social específica. Ele só será possível se articulado por forças democráticas renovadas, a começar pela esquerda, por amplos movimentos sociais, pela intelectualidade, por empresários, pelos mundos do trabalho e da cultura, enfim, por uma diversidade social e ideológica de quantos na sociedade brasileira almejam mudar os rumos do país.
Seria erro grave e inaceitável um único partido colocar-se como condutor deste grande movimento, até mesmo porque a sociedade organizada e os seus movimentos plurais em todos recantos e áreas são mais fortes que todos os partidos juntos. Uma esquerda contemporânea e um Projeto Estratégico Nacional pressupõem a colaboração estreita entre partidos, estes mais vocacionados para o exercício da democracia representativa, e os agentes sociais diversos, que fortalecem a cada dia mais a idéia de uma democracia mais includente e participativa, uma democracia mais direta.
Se no conjunto de toda a sociedade há que se operar processos rápidos e duradouros de novas consciências coletivas, conduzidos pela cidadania, no campo partidário também se coloca a necessidade da afirmação de uma esquerda capaz de refletir e defender as reivindicações populares e os interesses nacionais, sem esquecer que o ser humano é cidadão do mundo, que queremos íntegro.
A busca deste caminho terá de enfrentar poderosos obstáculos – sobretudo aqueles erigidos pelo conglomerado de grandes partidos mantenedores da ordem vigente, os quais teimam em, a partir de uma espécie de cartório, esmagar a rebeldia a favor de mudanças. Até mesmo quando clamam por reforma política o fazem majoritariamente na perspectiva minimalista de menos partido, menos liberdade, menos conflito. Como se pudesse haver futuro para o Brasil sem combate de idéias e propostas.
Importante ressaltar que todos os grandes partidos democráticos e de esquerda já estiveram ou estão no governo, desde o início do processo de redemocratização, em 1985. Tiveram oportunidade única de materializar seus programas, sua capacidade de gestão e cumprir seus compromissos, só que, na prática, negaram seus ideais e nada mais revelaram senão seus projetos menores de alcançar o poder e nele se manter a qualquer preço, pela via da cooptação de lideranças sociais, amortecimento das reivindicações populares e partidarização da máquina estatal. Encerra-se, assim, melancolicamente, mais um ciclo da nossa história, sem que os graves e agudos problemas nacionais tenham tido o encaminhamento exigido pela sociedade, nas suas necessidades de desenvolvimento social, retomada do crescimento e melhores condições de vida.
Perspectivas
O PPS, quando organizado em 1992 a partir da rica tradição de lutas do antigo PCB, iniciou seu processo de aggiornamento e agora dá novo passo à frente, abrindo-se para diferentes setores sociais, na tentativa de se discutir ampla e profundamente o que é ser uma esquerda moderna e democrática no país, identificar suas características e definir seu projeto efetivamente transformador para o Brasil. Fraterna e generosamente, coloca-se assim como instrumento para ajudar a construir este projeto inovador, o qual exige amplas articulações, negociações legítimas com lideranças que compõem outras organizações partidárias ou que estejam fora delas, e aberta a pessoas com variadas concepções políticas, ideológicas e religiosas, comprometidas com o avanço democrático e valores libertários.
O que os brasileiros estão a exigir é a existência de um movimento que tenha identidade programática e política, e um projeto de nação. Que procure defender e introduzir valores e comportamentos capazes de pedagogicamente provocar uma revolução na cultura política do país, na forma de exercer mandatos, na forma de ser governo e na forma de se relacionar com a sociedade civil. Que combata a esperteza de existir apenas para disputar e ganhar eleições, e atue a partir de doutrinas e ideais democráticos, humanistas, solidaristas, socialistas, estreitamente vinculados aos valores e práticas do ambientalismo, e identificados com as lutas pela igualdade e equidade de gênero, cidadania das mulheres, pluralidade étnica, diversidade sexual, e contra a exclusão, as desigualdades e todas as formas de discriminação social.
Também deve contemplar um programa estratégico factível, concernente à inserção do Brasil num mundo globalizado e às possibilidades reais do país, marchar pela utopia e agir com os pés no chão da realidade. Assim sendo, o esquerdismo retórico e inconseqüente e o liberalismo encilhado não servem a este projeto.
Com base nesses pressupostos, a Comissão Executiva do PPS convoca uma Conferência Nacional, decisão a ser apreciada pelo Diretório Nacional, a se realizar até julho próximo, aberta à participação de todos para discutir o que é ser uma esquerda moderna, suas características e seu projeto transformador para o Brasil. Nesse sentido, orienta seus dirigentes e militantes em todos os níveis a iniciar contactos com lideranças políticas, dos mundos do trabalho e da cultura, a organizar Conferências Estaduais preparatórias, para tanto contactando casas legislativas, escolas, sindicatos, universidades, bairros, sempre procurando agregar lideranças e pessoas interessadas em fazer ou continuar a fazer a grande política.
O caminho a percorrer não é fácil nem curto. Entretanto, se houver vontade daqueles que sinceramente acreditam nas mudanças e querem realizá-las, o tempo para percorrê-lo pode ser relativamente breve. Mãos à obra, pois a esperança dos brasileiros, a que se enfrentem com soluções inovadoras e viáveis os desafios colocados e há muito sendo adiados, impõe ações sem mais tardança.