Traçando um paralelo com a realidade brasileira, imaginemos um eleitor petista - daqueles legítimos, sinceros e espontâneos, portanto já extintos - que estivesse desacordado desde a campanha eleitoral de Lula em 1989, época em que vestia a camiseta do partido, ostentava o broche da estrela e cantarolava "Lula lá" e "Sem medo de ser feliz".
O sujeito inconsciente não acompanhou a vitória e o posterior impeachment de Collor, a transição com Itamar Franco, o controle da inflação, o Plano Real, os dois mandatos de FHC. Mais que isso: não viu "a esperança vencer o medo", e Lula enfim ser eleito na sua quarta disputa presidencial.
Essa é a parte boa que o militante desacordado não vivenciou, quase um sonho realizado para toda uma geração. O paraíso na Terra.
Porém, o que o petista retornando do coma em 2014 custaria a acreditar é o que viria no "pós-Lula". A lista completa de ex-inimigos do PT que se tornaram aliados e partícipes do tal "governo de coalizão": Sarney, Collor, Maluf, banqueiros, empresários, evangélicos, ruralistas, fisiológicos de plantão. O mensalão.
Como explicar ao petista - talhado na oposição - a transmutação daquele partido ideológico modelo numa mera legenda ordinária e pragmática? E os ataques do PT à imprensa, ao Ministério Público e à Justiça? As armações do partido contra as CPIs? As ações antidemocráticas e antirrepublicanas? As ameaças à liberdade de expressão e pensamento? O cerceamento da oposição?
O petista, acordando hoje, jamais acreditaria que seus líderes e ídolos José Dirceu e José Genoíno estão na cadeia - não por obra da ditadura, mas de um julgamento democrático em pleno Estado de Direito, sob o governo do próprio PT.
Nunca levaria a sério que a presidente da República é uma ex-guerrilheira, oriunda do brizolismo e neófita no Partido dos Trabalhadores, preferida por Lula entre todos os demais fundadores e dirigentes históricos.
Se o sujeito ainda resistir e sobreviver a tanta informação, conte a ele que as manifestações que vão às ruas hoje são quase todas contra o PT. Que os movimentos populares e os jovens estão órfãos e descrentes na política e nos políticos. Que as bandeiras vermelhas e gritos de guerra do povo nas ruas são de protestos anti-petistas.
Liste os nomes de Luiza Erundina, Hélio Bicudo, Plinio de Arruda Sampaio, Fernando Gabeira, Marina Silva, Cristóvam Buarque, Heloísa Helena, Ivan Valente, Bete Mendes, Chico Alencar, Eduardo Jorge e até do cantor Lobão como dissidentes e os mais ferrenhos críticos, hoje em dia, do PT.
Conte também que o neto de Tancredo Neves, o ex-governador e senador de Minas, Aécio Neves, e o neto de Miguel Arraes, o governador de Pernambuco, Eduardo Campos, são hoje os verdadeiros representantes da oposição e as melhores e mais viáveis alternativas democráticas ao governo autoritário e corrupto que se instalou no poder.
Está feito o estrago.
Assim morreria desiludido o último dos velhos petistas...
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