A ex-vereadora Soninha Francine (PPS) teve uma segunda-feira digna dos dias mais concorridos da campanha eleitoral de 2008, quando disputou a Prefeitura de São Paulo e vivia na mídia concedendo intermináveis entrevistas.
Como subprefeita da Lapa e já declarada postulante à Prefeitura de São Paulo em 2012, Soninha foi destaque no Jornal do Brasil e à noite na MTV, no programa "Gordo Visita", no qual o cantor e apresentador João Gordo entra na casa dos entrevistados.
O programa "Gordo Visita" na casa de Soninha será reprisado no próximo domingo, 8 de março, às 21h30.
Segue abaixo a íntegra da entrevista ao Jornal do Brasil:
Soninha fala sobre sua trajetória política e planos para o futuro
Marcello D'Angelo, Jornal do Brasil
SÃO PAULO - Franqueza, espontaneidade e paixão são características que brilham nos olhos de Soninha Francine, 41 anos, quando conversa sobre sua trajetória política.
- Infelizmente, quase todos os políticos brasileiros, mesmo os que entram revoltados, quando estão dentro do sistema, logo se conformam. Ah, é assim? Fazer o quê... Eu não, eu sou inconformada e vou continuar sendo assim - garante.
No mundo político institucional desde 2004, quando se lançou candidata a uma vaga na Câmara de Vereadores de São Paulo e venceu, Soninha disputou, pelo PPS, a eleição para a prefeitura de São Paulo no ano passado. Abocanhou 4% dos votos válidos, ficando em quinto lugar no primeiro turno. Há menos de dois meses, Soninha assumiu a subprefeitura da Lapa, bairro com 270 mil habitantes – o equivalente a uma grande cidade do interior do país.
- É uma chance concreta de interferir para melhorar a vida da população - diz, nesta entrevista.
Jornal do Brasil: Quando você despertou para a política?
- Quando eu tinha 10, 11 anos e estava no ginásio, queria fazer esportes, artes e política. Mais tarde, na hora de decidir, já no colegial, escolhi Educação Física. Pensava em ser professora de educação física ou treinadora.
Jornal do Brasil: Chegou a desistir da política naquele momento?
- Desencanei da política partidária porque, mesmo muito jovem, eu já acompanhava de perto e via o quanto era difícil. Eu sabia quem eram os vereadores, o que estavam aprontando. Na época, o prefeito tinha o recurso do decreto-lei. Eu sabia de todas as manobras da base governista do então prefeito Jânio Quadros para nunca dar quorum e aprovar os decretos. Eu ficava tão revoltada, com tanta raiva, e pensava: o que vou fazer nesse lugar?
Jornal do Brasil: Foi quando começou na educação física?
- Percebi que a universidade estava fora do meu alcance. Eu só poderia fazer na USP (Universidade de São Paulo), não podia pagar. E a educação física na USP era em período integral. Eu tinha duas filhas e trabalhava o dia inteiro. Lecionava Inglês, trabalhava em creche tomando conta de crianças. Eu não tinha a menor possibilidade de passar um dia inteiro na faculdade, precisava ganhar dinheiro e de tempo para ficar com as minhas filhas. Como tinha desistido da política, sobrou o lado das artes.
Jornal do Brasil: Chegou a encarar isso profissionalmente?
- Fiz faculdade de cinema na USP, quando a segunda filha já estava um pouquinho maior. Depois de um mês, fui convidada para trabalhar na MTV e virei trabalhadora de televisão, algo que eu não planejava.
Jornal do Brasil: E como acabou ingressando de vez na política?
- Em 2003, eu estava muito deprimida e frustrada com a minha vida fora da política. Eu não aguentava mais pressionar os políticos, esperar dos políticos e questionar os políticos. Resolvi retomar aquele sonho de infância e me candidatei a vereadora nas eleições de 2004.
Jornal do Brasil: Após a experiência com o mandato no Legislativo municipal, o que mudaria no sistema político-eleitoral?
- No longo prazo, reforma política para rever muita coisa no sistema eleitoral, na divisão entre os Poderes, especialmente no âmbito estadual. É de se perguntar se precisa ter uma Assembléia Legislativa permanente, já que a competência legislativa dos estados é muito limitada, mais do que a do município, autorizado pela Constituição federal a fazer regras para várias coisas. Existem outras maneiras de fiscalizar o poder público sem ser necessariamente com um corpo de parlamentares eleitos e remunerados para isso.
Jornal do Brasil: Como avalia a função de vereador?
- Não gostei deste lado de despachante, de interferir para resolver problemas pessoais. E da prática comum de obstruir as ações da prefeitura. Quanto mais instrumentos de participação direta das pessoas para reivindicar, questionar, sugerir, mais será esvaziada essa necessidade do intermediário público. Eu gosto muito dos conselhos gestores das unidades de saúde, de parques municipais, de escolas. Alguns funcionam bem, outros nem tanto, mas se forem representativos e eficientes, é possível dispensar o elevador de recados. Quanto mais conselhos de participação popular tivermos, melhor as pessoas vão interferir e as autoridades sentirem a bronca. E os problemas finalmente serão divididos.
Jornal do Brasil: E a população exerce a cidadania.
- Isso funciona para a população como a bendita reunião de condomínio. Botar as pessoas para discutir entre elas os dilemas para ver como se resolvem conflitos de competência. Esse é um lado. O outro é o poder ferrado de obstrução da Câmara. Temos dois extremos: a obstrução, o obstáculo à atividade do Executivo, a capacidade de atrapalhar, de sabotar, de prejudicar. E o extremo, da maioria do rolo compressor. Ou o governo não consegue passar nada, ou consegue aprovar qualquer coisa.
Jornal do Brasil: A negociação fica muito prejudicada?
- É, não tem debate, só negociação o tempo todo. Com todo o espectro de sentidos que isso pode ter, pejorativos ou não. Negociação faz parte de qualquer conquista, de qualquer superação de divergências. Mas o problema é que a negociação não tem nada a ver com o conteúdo da proposta. A gente aceita esse projeto de lei, mas desde que este ponto aqui seja revisto. Para aprovar tal projeto, terá de fazer esse e aquele aperfeiçoamento. Mas não é isso que acontece. Uma das negociações mais razoáveis que presenciei na Câmara foi assim: Ah, o prefeito quer aprovar esse projeto? Então ele precisa aprovar três projetos de cada vereador aqui da bancada. Senão iremos obstruir até tal data.
Jornal do Brasil: Ficou satisfeita com o resultado da campanha para prefeita de São Paulo?
- Fiquei porque como em várias outras coisas, na política também tem o tangível e o intangível. O resultado tangível é ter disputado uma eleição majoritária pela primeira vez, por um partido minúsculo que nunca tinha concorrido numa eleição majoritária em São Paulo, o PPS, e obter 266 mil votos. O apoio de 4% dos eleitorado é algo significativo, principalmente levando em conta o tamanho do partido. A Luíza Erundina (deputada federal pelo PSB de São Paulo) tinha sido prefeita quando disputou uma eleição e teve isso, ou menos. O Serra (governador de São Paulo, José Serra (PSDB-SP) na primeira eleição majoritária que ele disputou, teve 5,5% dos votos. Eu não era nada, era vereadora, poucos me conheciam.
Jornal do Brasil: Ter sido apresentadora de um canal segmentado de televisão não ajudou?
- Eu sei lá. Quantos votos eu teria tido se tivesse que começar do zero me apresentando para as pessoas? Eu fiquei bem satisfeita, embora no final a gente não tenha passado o Maluf. Passar o Maluf seria legal por tudo o que isso representa para várias gerações. E esse movimento de última hora não foi iniciativa minha nem do partido, foi viral, de internet. E o intangível é mais legal ainda: foi a molecada que se interessou muito pelas propostas da minha candidatura. Os moleques vinham cantando o jingle da minha campanha, que passou meia dúzia de vezes no horário de propaganda eleitoral gratuita. Eu tinha um minuto e meio e zero inserções em comerciais. A molecada prestou muita atenção e acreditou muito. Eles me encostam na parede e perguntam: você vai fazer mesmo ciclovia? E o que você acha disso e daquilo?
Jornal do Brasil: Por que você aceitou o cargo de subprefeita?
- Eu não quero mais ser parlamentar, mas também não quero me afastar da política. Quero trabalhar no Executivo. Sempre esperei pela possibilidade de interferir de fato e, embora as subprefeituras não possuam tantos recursos nem autonomia suficientes para empreender grandes mudanças na vida das pessoas, esse é o lugar de fazer pequenas e médias mudanças.
Jornal do Brasil: Nesses quase dois meses na função, sentiu que é possível desempenhar esse papel?
- Por enquanto só sei que devo estar preparada para um trabalho muito difícil, pois tenho de lidar com uma variedade enorme de problemas diferentes, pelos quais eu tenho de responder a todos. Tudo isso tem exigido tanto de mim que chego a sonhar com o trabalho.
Jornal do Brasil: Os moradores procuram a subprefeita para resolver que tipo de problemas?
- A Lapa tem uma arborização acima da média para a capital paulista. São árvores antigas e de grande porte sufocadas pelas ruas e calçadas, muito maltratadas pela poluição. Existem milhares de pedidos acumulados de remoção e poda dessas árvores. O comércio irregular é outro problema e a quantidade de denúncias contra a má conduta de servidores é outra dor de cabeça, mas elas chegam totalmente sem consistência para uma investigação. Enfim, às vezes isso aqui é um pouco desesperador. As enchentes também geram muitas demandas.
Jornal do Brasil: E quanto ao seu futuro na política?
- Se eu não desistir (risos) eu vou disputar outra vez a eleição para a prefeitura de São Paulo, em 2012. Se eu aguentar, pois em pouco mais de um mês neste cargo vi o quanto é pesado ser subprefeita, imagina prefeita. Mas apesar de ser um inferno, é também desafiador porque dá chance de fazer coisas concretas e a população é receptiva na hora que o poder público chama para ajudar. Essa função está me dando chance de continuar pensando como eu faria para melhorar a cidade neste e naquele aspecto.