No próximo dia 22 de março, celebramos o Dia Internacional da Água, mas será que temos o que comemorar?
Cerca de um bilhão de pessoas no mundo não têm acesso à água potável; 2,5 bilhões de pessoas não dispõem de qualquer tipo de serviço de saneamento; cerca de 8 milhões de pessoas morrem por doenças relacionadas à má qualidade da água, 50% delas são crianças.
Estes dados alarmantes de um estudo sobre o Desenvolvimento dos Recursos Hídricos no Mundo, patrocinado pelas Nações Unidas (ONU), revelam a face mais perversa de gestões equivocadas, da falta de recursos para preservação e os efeitos das mudanças climáticas em todo o mundo.
Diante deste panorama global de escassez, é fundamental estabelecermos metas globais para o uso mais racional deste recurso natural finito e indispensável para a vida, tratar a água como a nova commodity ambiental.
Este é um dos motivos que me levou a participar, como representante do Congresso Nacional, do V Fórum Mundial da Água, organizado pelo Conselho Mundial da Água e o Governo da Turquia, entre os dias 16 e 22 de março, em Istambul.
Realizado a cada três anos, o evento é considerado o mais importante acontecimento internacional para tratar do tema sob o impacto das mudanças globais, da variabilidade e das mudanças climáticas, além da gestão dos recursos hídricos.
São esperados cerca de 20 mil participantes, entre profissionais do setor, pesquisadores, parlamentares, representantes governamentais, ONGs de todo o mundo e agências da ONU.
A proposta dos organizadores, a partir da presença de parlamentares de todo o mundo, é estabelecer um compartilhamento político e técnico das diferentes experiências internacionais, no sentido de proporcionar uma abordagem mais profunda e global acerca dos desafios e das ações que precisam ser adotadas em relação à preservação dos recursos hídricos e a garantia do acesso à água potável.
Entre os temas que deverão ser debatidos está a necessidade de definir diretrizes para a cooperação transfronteiriça, os direitos ao uso da água e a disseminação da gestão descentralizada dos recursos hídricos.
Sobre este último, tive a oportunidade de ser o relator do anteprojeto que introduziu o conceito de bacias hidrográficas como critério de organização político-territorial, durante a aprovação da Constituição Estadual, em 1989.
Hoje, no Estado de São Paulo, dispomos de 21 Comitês de Bacias Hidrográficas formados por um colegiado tripartite, com representantes de prefeituras, órgãos do governo estadual e entidades da sociedade civil organizada. Trata-se de uma iniciativa inovadora de compartilhar responsabilidades e descentralizar as ações em torno da preservação dos nossos recursos hídricos, que está sendo implantada em todo o País, sob a coordenação da ANA (Agência Nacional de Águas).
Estes comitês são responsáveis pela elaboração e a implantação de políticas públicas de fiscalização, recuperação, uso racional, educação ambiental e investimentos em saneamento e tratamento de efluentes, aliando o desenvolvimento social e econômico regional com a necessidade latente de preservação.
Ainda sobre este tema, persiste o desafio de avançarmos no quesito saneamento básico. Estima-se que para cada real investido em saneamento, correspondem a quatro reais na área da saúde. Apesar da importância de um adequado sistema de coleta e tratamento de esgotos para a proteção da saúde da população, menos da metade dos brasileiros (47%) dispõe deste tipo de serviço. Jogamos em rios e córregos 80% dos nossos esgotos sem qualquer tipo de tratamento. Por isso, a taxa de mortalidade de crianças (de 1 a 6 anos) que moram em locais sem coleta de esgoto é 32% maior do que entre as que dispõem deste tipo de serviço.
Diante deste cenário, criamos um grupo de trabalho sobre saneamento no PPS estadual que promoveu, recentemente, um seminário com a secretaria estadual de Energia e Saneamento do Estado de São Paulo, Dilma Pena. Na ocasião, foram apresentados os detalhes da regulamentação da Lei 11.445/2007, que estabelece as diretrizes nacionais sobre saneamento básico no País, para uma platéia composta por prefeitos, vereadores, representantes de ONGs, órgãos públicos de defesa do meio ambiente e lideranças políticas de todo o Estado.
Outro tema de destaque é o impacto das mudanças do clima no mundo. A temperatura do planeta já subiu e vai subir mais, as geleiras se derretem rapidamente, o mar e os rios engrossam e aumentam de nível, mais e mais regiões na Terra são inundadas, há mais furacões e tormentas. Assim como, também há o oposto, ou seja, regiões ficam mais secas, alguns lugares viram desertos. O aquecimento global agrava questões da água em todas as suas variantes. Muitas destas questões podem ainda não ter resposta porque a ciência desenha vários cenários climáticos que dependem de atitudes globais do presente.
O Dia Internacional da Água é o momento propício para uma profunda reflexão sobre a forma que o poder público, setor produtivo e sociedade tratarão neste século a gestão dos recursos hídricos. Embora tenhamos o privilégio de concentrar 11,6% de toda a água potável do planeta, este recurso não é inesgotável, é um bem público, dotado de valor econômico. Consumo humano, geração de energia, agropecuária, produção industrial, todos estes aspectos precisam ser considerados no planejamento e gerenciamento dos nossos recursos hídricos para o futuro das próximas gerações.
Arnaldo Jardim é deputado federal (PPS/SP), membro da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável e integrante da Frente Parlamentar Ambientalista.