O pragmatismo considera que uma ideia é útil e necessária se tiver efeitos práticos e funcionais.
Charles Peirce, o terror dos estudantes de Comunicação, um dos pais da semiótica, junto com William James, foi quem dissecou: o significado de qualquer conceito é a soma de todas as consequências possíveis.
"O método pragmatista é de terminar discussões metafísicas, que de outro modo seriam intermináveis. O mundo é um ou muitos? Livre ou destinado? Material ou espiritual?", perguntava James, antevendo a náusea causada pelos existencialistas, que sangraram o sentido de essência e existência, tornando dolorida a vida de todos nós.
"Não é hora de ser pragmático, é hora de ser sonhático e de agir pelos nossos sonhos", disse Marina Silva, 20 milhões de votos na última eleição, ao anunciar a desfiliação ao PV.
"Estamos procurando metabolizar uma nova forma de fazer política. Não há ainda uma fórmula. As pessoas estão na expectativa, mas também estou. Não deve ser criada a ilusão da velha liderança."
Parece Lula no verão de 1980 no Colégio Sion, procurando angariar simpatia dos movimentos sociais e reunificar as esquerdas para o projeto utópico de um partido puro, fiel a seu programa, livre dos vícios da política partidária anterior.
Marina lembrou que, ao se candidatar em 2010, depois de largar o PT, pensava na criação de "um grande movimento", e que deveríamos "reinventar o futuro".
Confirmou que a experiência no PV serviu para sentir que o sistema político brasileiro está "empedernido" e sem capacidade de renovação.
O sistema partidário petrificado é fruto de uma esperteza do general Golbery do Couto e Silva, o mentor da ditadura brasileira, que ao ver ameaçada a liderança do partido governista, Arena, num sistema bipartidário artificial, extinguiu os dois partidos de então e liberou o registro de novos.
O resultado é que, segundo o TSE, têm registro os manjados PMDB, PSDB, PTB e seu racha PDT, o PT, fundado no Colégio Sion, e seus rachas PSOL e PSTU, o DEM e o PP, o PCB e seus rachas PCdoB e PPS, PSB, PCO e PV.
Também tem registro: PTC (Partido Trabalhista Cristão), PSC (Partido Social Cristão), PMN (Partido da Mobilização Nacional), PRP (Partido Republicano Progressista), PTdoB (Partido Trabalhista do Brasil), PRTB (Partido Renovador Trabalhista Brasileiro), PHS (Partido Humanista da Solidariedade), PSDC (Partido Social Democrata Cristão), PTN (Partido Trabalhista Nacional), PSL (Partido Social Liberal), PRB (Partido Republicano Brasileiro), PSD (Partido Social Democrático).
E o que agora não sai das páginas policiais, o PR (Partido da República).
Suas causas se dividem em trabalhismo centrismo, participativo e populista, conservadorismo liberal, democracia cristã, sincretismo, liberalismo social, humanismo, trotskismo, comunismo marxista-leninista, socialismo, ambientalismo e "distributismo" (PHS), filosofia econômica defendida por pensadores católicos, que prega que os meios de produção devem ser amplamente distribuídos.
São os termos que regem seus programas. Sem contar os que seguem salmos evangélicos e cristãos.
Escândalos políticos e a propaganda eleitoral gratuita captada por um zapping casual dão pistas de quem faz parte da base aliada, reparte o bolo, sorri nas fotos, administra correios, aeroportos, portos, estradas, agências reguladoras, serviços essenciais.
Sim, era o PR que tomava conta do Dnit, órgão fundamental para o crescimento do País e a manutenção das nossas estradas e vidas. Desvios de verbas foram detectados. O ministro dos Transportes, exonerado.
Continua na mão do PR, ainda, a fatia bilionária do bolo, para o bem da governabilidade.
"O ideal que move as pessoas para melhorar o mundo em que vivem, e onde no futuro outros irão viver, deve estar na popa e não na proa, a nos impulsionar para o futuro", defende Marina.
Mas o que todos se perguntam é se será Alice Braga ou Dira Paes a escolhida para interpretá-la no filme de Sandra Werneck (já fizeram testes), e se ela se filiará a outro partido.
Há os com registro em TREs estaduais, que aguardam o do TSE, como o Partido da Transformação Social (PTS), Partido Ecológico Nacional (PEN), Partido Federalista (PF), Partido Humanista do Brasil (PHB), Partido Pátria Livre (PPL).
Existem os em processo de legalização: Conservadores (CONS) e seu racha, o Partido Conservador (P-CON), Libertários (Liber), Movimento Negação da Negação (MNN), Partido Autonomista (Auto), Partido da Organização Parlamentar (POP), Partido da Mulher Brasileira (PMB), Partido da Real Democracia (PRD), Partido de Representação da Vontade Popular (PRVP), Partido do Esporte (PE), Partido do Terceiro Setor (P3S), Partido Geral do Trabalho (PGT) e outro racha, o Partido Geral dos Trabalhadores do Brasil (PGTdoB), Partido Livre (Livre), Partido Nacional do Consumidor (PNC), Partido Nacionalista Brasileiro (PNB), Partido Nacionalista Democrático (PND), Partido Novo (Novo), Partido Socialista Estudantil (PSE), Partido Verde Amarelo (PVA) e a velha conhecida União Democrática Nacional (UDN).
Sem contar as agremiações sem registro, algumas já famosas, como a União Democrática Ruralista (UDR), a Liga Estratégica Revolucionária (LER-QI), que aparentemente defende a luta armada, com grande penetração no meio estudantil, e o Partido Pirata do Brasil (PPB), o legítimo que, espera-se, não rache ou tenha cópias - movimento pertencente ao PPInternational, forte nos países escandinavos e atuando em mais de 50 países.
Há ideais históricos, bem fundamentados, assim como há muita malandragem.
Na farofa ideológica, talvez se entenda por que os aeroportos estão caóticos, muitos morrem nas estradas, a saúde e educação são precárias, e os altos impostos não implicam bons serviços.
Contam-se nos dedos as obras de infraestrutura em andamento.
Abrir um partido pode ser um negócio. Mais lucrativo e talvez menos burocrático do que abrir uma empresa. Sua agenda: empregar o maior número de aliados, com carteirinha ou não.
Pertencer à base governista é como ser da elite de uma federação comercial. Os lucros giram entre 10% a 50% do orçamento afanado dos cofres públicos.
Diferentes correntes ideológicas sugam do mesmo bolo.
Há décadas que se tenta uma reforma política, já que a atual não é nada pragmática (funcional).
Impossível, se são os próprios interessados que devem conduzi-la. Mas não custa ter sonhatismos eventuais.
(Artigo de Marcelo Rubens Paiva, publicado em O ESTADO DE S. PAULO de 16 de julho de 2011)