O banquete salarial dos congressistas ofuscou a disputa pela presidência da Câmara Municipal de São Paulo. O "centrão" foi, enfim, apeado do comando da Casa, depois de vários anos. Nada parece ser pior do que o "centrão". Mas é menos o caso de comemorar do que de destacar a indigência e os aspectos sinistros dessa disputa.
Passou meio despercebido, mas Aurélio Miguel (PR), o vereador-judoca do "centrão", foi à sessão portando uma espada usada no haraquiri, o ritual suicida dos samurais quando julgam ter perdido a honra.
Era uma maneira de intimidar os "traidores", os que "desonraram a família" (ou a "famiglia"?). A ameaça era dirigida em especial à dupla do PMDB, que seguiu a orientação de Kassab e ajudou a derrotar Milton Leite, do "centrão" e do DEM, mas que teve o apoio maciço do PT.
Diga-se o que se quiser -que a espada era "um símbolo", uma "metáfora", "um mimo"-, o fato é que o vereador foi ao plenário com um tipo de arma. Lembra até uma versão oriental do deputado Tenório Cavalcanti, o famigerado Homem da Capa-Preta. Aonde chegamos no Legislativo da maior capital do país? Chamar isso de quebra de decoro é quase uma delicadeza.
A truculência, física inclusive, não tem sido estranha ao "centrão", esse grupo suprapartidário de 17 vereadores "independentes" (sobretudo de PR, DEM e PTB), que se tornou o fiel da balança entre governo e oposição. Historicamente, parecem ser uma evolução da "máfia dos fiscais", como ficou conhecido o bando que implodiu e ajudou a implodir o governo Pitta.
Por coincidência, no mesmo dia em que o "centrão" sofreu seu revés, o camelô que denunciou o esquema de achaque dos vereadores no fim dos anos 90 foi assassinado. Mas -repito- é uma coincidência.
Alguém pode lembrar ainda do recente assassinato do prefeito de Jandira, na Grande São Paulo. Essas coincidências dão uma amostra do nível do faroeste municipal hoje no Estado mais avançado do país.
(Artigo de Fernando de Barros e Silva, publicado na Folha de S. Paulo de sábado, 18 de dezembro de 2010)