quarta-feira, 1 de agosto de 2007

Artigo de Clóvis Rossi: "Elite x Elite"

CLÓVIS ROSSI *

Nada contra espinafrar as elites. Já até cansei de fazê-lo. É difícil encontrar em outro país, fora da América Latina, elites tão pequenas e tão predadoras como a brasileira.

Mas é desonesto tentar caracterizar o atual confronto oposição/governo como uma contenda da elite contra o povão. Nada mais é que elite x elite.

É desonesto, por exemplo, apresentar Luiz Inácio Lula da Silva como líder metalúrgico. Faz um quarto de século que Lula deixou de sê-lo (mais, na verdade, porque, como presidente de sindicato, já não pegava no torno).

Entrou para a elite. Ou alguém aí conhece outro ex-metalúrgico que tenha renda para comprar um apartamento parecido com o de Lula e, de quebra, ter sobra de dinheiro para investimentos financeiros como os declarados pelo presidente? Não, não é crítica a Lula. É elogio.

É bacana ver alguém ascender na vida por seus meios e sua luta. Mas usemos os rótulos adequados, não uma falsificação.

Marta Suplicy, por acaso, é operária? Aloizio Mercadante é camponês? Ricardo Berzoni é sem-teto? Essa gente toda faz -sempre fez- parte da elite. Nos governos anteriores, era a contra-elite, assim como a oposição atual é a contra-elite do momento.

Um governo em que as principais políticas econômicas são determinadas por um banqueiro como Henrique Meirelles é contra a elite? Francamente ridículo.

A demonstração acabada de que é uma briguinha de elite contra elite está dada pelo fato de que a política econômica da elite ora no poder é muito semelhante à da elite antes no poder, hoje na oposição.

Nada também contra quem toma partido a favor de uma elite ou da outra. Desde que não minta: não se trata de uma batalha de idéias e de projetos para o país mas de um confronto pelo poder. Ponto.


(* artigo publicado na Folha de S. Paulo de hoje)