terça-feira, 22 de maio de 2007

Entrevista com José Saramago

Ontem à noite, o Jornal da Globo exibiu a primeira parte de uma entrevista com José Saramago, "o maior autor de língua portuguesa ainda vivo". Assista. Hoje, terça-feira, será exibida a segunda parte, quando Saramago fala do governo Lula, de terrorismo e de sua reação ao saber que ganhou o maior prêmio literário do planeta.

Acompanhe trechos da reportagem:

O escritor escolheu uma ilha como seu mundo. Há 14 anos, Saramago vive isolado num arquipélago diante da costa da África – de onde lança sua voz crítica a sociedades, governos e governantes.

Único autor de língua portuguesa premiado com o Nobel de Literatura, um dos maiores intelectuais da atualidade emocionou ao citar na cerimônia o avô, Jerônimo, e a avó, Josefa – os dois analfabetos. “O homem mais sábio que conheci em toda a minha vida não sabia ler nem escrever....”, ele disse na época.

A mãe, Maria da Piedade, também não sabia ler nem escrever. “Lembro-me dela a sair de casa para lavar uma escada que tinha três ou quatro andares, com o balde, com o sabão e com o esfregão e a escova, escova dura para raspar. Era assim”.

Saramago teve mãe faxineira, pai guarda-civil e avós criadores de porcos. O único irmão, Francisco, morreu aos quatro anos. “A minha relação com a minha infância,que já podia estar esquecida ou transformada em outra coisa, se eu pudesse repeti-la, repeti-la-ia exatamente como foi: com a pobreza, com o frio, com a pouca comida, com as moscas e os porcos e com tudo aquilo”, diz. “Eu não quero cair, enfim, nesta coisa do miserabilismo: ‘eu fui pobre, eu fui pobre, eu fui pobre’”.

José de Souza Saramago foi estudar em escola técnica, e tirou diploma. “Saio serralheiro mecânico e exerço como serralheiro mecânico numa oficina de automóveis, rodando válvulas, reparando motores e coisas assim”, ele conta. Mas diz que hoje ainda não é capaz de consertar um carro. “Hoje não, porque eu não sou quem era, mas também o automóvel também não é quem foi”.

O ex-mecânico construiu uma carreira excepcional. “Não houve uma força superior que olhasse pra mim e dissesse: ‘bom, vou te preparar uma vida muito bonita’. Não, não, não. Agora, é uma vida que não podia ter sucedido, em termos de pura lógica", reconhece.

O repórter da Globo destaca que a entrevista foi gravada na grande biblioteca do homem que nem sequer tinha dinheiro para comprar livros.

O comunista, racional, fala da transformação trazida pela paixão por uma mulher. “A minha vida não seria aquilo que é hoje, não teria essa biblioteca se eu não tivesse conhecido a Pilar”, ele diz.

Em Lisboa, aconteceu o primeiro encontro, a atração – a princípio, intelectual: os dois apaixonados pelo poeta Fernando Pessoa e pelo marxismo.

Saramago está sempre atento – e crítico – às mudanças da história. “A globalização é um totalitarismo. Totalitarismo que não precisa nem de camisas verdes, nem castanhas, nem de suásticas. São os ricos que governam, e os pobres vivem como podem. Então, isto tem aspectos totalitários de fato, porque se tu controlas a economia mundial, os movimentos do dinheiro, a circulação dos bens, de uma certa maneira também controlas a circulação das pessoas, que é o que está a acontecer”, analisa.


Hoje à noite tem a segunda parte. Imperdível.